Estou aqui imaginando como será o futuro sem documentos empoeirados, que trazem a marca do tempo, aqueles com o amarelecimento das páginas, com os vestígios de invasores microscópicos que se deliciam com o papel. Sim, porque teremos tudo digital em bits e bytes, tudo na nuvem e esse formato não permite essas marcas, talvez o reconheçamos como "empoeirado" apenas por conta da obsolescência do suporte e da tecnologia.
Não é saudosismo, é apenas uma constatação sabendo que essa é a tendência da realidade e que talvez tenhamos apenas o legado já constituído dessa era do papel, claro, se preservado com os devidos cuidados, porque o mundo hoje já é digital. Se é digital, seu legado para o futuro também será digital, privando-nos da "poeira dos arquivos" de que falo adiante.
Em Diário de uma expedição, escritos que deram origem à obra Os Sertões, Euclides da Cunha ressalta a sensação dessa experiência, de lidar com registros históricos preciosos, para fazer descobertas sobre os fatos.
"A poeira dos arquivos de que muita gente fala sem nunca a ter visto ou sentido, surgindo tenuíssima de páginas que se esfarelam ainda quando delicadamente folheadas, esta poeira clássica — adjetivemos com firmeza — que cai sobre tenazes investigadores ao investirem contra as longas veredas do passado, levanto-a diariamente. E não tem sido improfícuo o esforço.“ (Euclides da Cunha, 21 de agosto de 1897, Canudos: diário de uma expedição)
Euclides da Cunha, enquanto correspondente do Jornal O Estado de São Paulo, fez viagens à Bahia para entender o desenrolar das atividades de Canudos sob a égide de Antônio Conselheiro, até a tragédia final. Os documentos de arquivo foram fundamentais para elucidar os fatos até então não conhecidos, e como vimos culminou na grande obra histórico literária.
CUNHA, Euclides da. Canudos: diário de uma expedição. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
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