Trago na íntegra o artigo de Gabriel Perissé publicado na edição de junho de 2012, da revista Profissão Mestre. Fiz a leitura e não hesitei em postar aqui, neste espaço de leitura e contexto, tem tudo a ver.
O artigo é muito oportuno, pois chama a atenção para atitudes e posturas negativas em relação à prática da leitura, que ocorrem no cenário didático pedagógico brasileiro e mostra que é possível reverter a situação, sugerindo no final livros adequados conforme o contexto: "[...]
temos de sugerir livros e textos relacionados ao que está acontecendo ao
nosso redor.."
Em postagem anterior, fiz pequeno comentário acerca de outro livro de Perissé, Ler, pensar e escrever, o qual não é citado no rodapé desse artigo, mas que vale a pena ser lido para completar o tema.
Também em postagem anterior, trouxe o livro História universal da destruição dos livros, de Fernando Báez, que trata da destruição física do livro, o "livrocídio direto", de que fala Perissé.
Direto ou indireto, leituras se completam e geram conhecimento.
Vamos ao artigo de Perissé!
O livrocídio direto consiste em queimar bibliotecas, fechar editoras e censurar escritores. É assim que se destrói um país, um povo, uma cultura. Muitos livros foram eliminados antes e depois de guerras, genocídios e perseguições políticas e religiosas.
No entanto, há formas menos evidentes de livrocídio. Tornar a leitura insuportável é também assassinar o livro, a longo prazo. Sufocando a leitura pouco a pouco, mata-se o livro... silenciosamente.
Podemos, numa sala de aula, matar a vontade de ler de nossos alunos? Podemos. Não é necessário, para isso, rasgar as páginas de um livro ou falar mal do autor! Basta fazer da leitura uma obrigação desagradável, improdutiva e estressante.
Nossas intenções são sempre as melhores. Ansiamos que nossos alunos sejam leitores plenos. Os métodos é que estão equivocados.
Um desses equívocos é nos preocuparmos mais com as provas e testes sobre a leitura e menos com o desenvolvimento dos próprios leitores. Se avisamos que a leitura obrigatória será objeto de perguntas (capciosas, difíceis) na primeira aula da próxima segunda-feira, que bela e entusiasmada leitura nosso aluno fará no final de semana!
As provas e testes produzem leitores padronizados. A leitura deixa de ser exercício intelectual, viagem imaginativa, ocasião de descobertas e autodescobertas, para se tornar manual de instruções. O leitor deverá dar a resposta certa. Ou será punido!
A principal consequência desse equívoco didático é aniquilar o interesse pela leitura, substituído agora pela necessidade de conseguir uma boa nota. Essa história já é tão conhecida... E o final jamais é feliz.
Outro equívoco: insistir na leitura de textos e obras que não dialogam com o universo dos alunos. É claro que José de Alencar, Machado de Assis, Clarice Lispector, José Lins do Rego, Manuel Bandeira, Cecília Meireles e Guimarães Rosa devem ser lidos. Na hora certa! E esta hora não é necessariamente a do ensino médio.
Outro equívoco que promove o livrocídio: fazer a desleitura dos livros. A desleitura solicita resumos (que se copiam de vários sites da web), prende-se em demasia à biografia do autor e ao contexto histórico, repete as interpretações já consagradas, transforma o livro em meio e não numa finalidade (prazerosa) em si. Tal desleitura afasta os leitores dos livros. E estes, abandonados, cometem livrocídio coletivo!
Existe algo mais desanimador para uma criança ou adolescente do que as eternas fichas de leitura, que querem fixar a leitura? Que ideia fixa é esta? Queremos fixar ou libertar? Parodiando Adélia Prado: “eu leio um livro para ver se me livro!”
Os livros podem ser uma bela paisagem para o aluno contemplar, visitar, explorar e recriar. Mas se apresentarmos essa paisagem por uma janela estreita, a visão se limita, a visita se impossibilita, não haverá exploração ou recriação alguma. Apresentar a literatura e outros textos pela janela deprimente de uma prisão faz da leitura tarefa sufocante. Os nossos alunos veem a leitura nascer quadrada. E sonham fugir para mundos melhores.
Para que serve a leitura, afinal? Como trazer os livros para a vida das crianças e dos jovens? Como tornar a escola um lugar onde os livros vivam e deem intensidade às nossas vidas?
A leitura nos ajuda a sermos intérpretes originais do nosso cotidiano, e deve se tornar tema de animadas discussões em sala de aula. Para isso, temos de sugerir livros e textos relacionados ao que está acontecendo ao nosso redor.
Obras e autores clássicos não estão excluídos. Contanto que saibamos atualizá-los, vinculando-os aos problemas que preocupam a todos, aqui e agora.
Texto publicado na edição de junho de 2012 da revista Profissão Mestre. Deixe seu comentário na seção Voz do Leitor.
10/08/2012 15/08/2012
Livrocídio
Gabriel Perissé
Livrocídio
Gabriel Perissé
O livrocídio direto consiste em queimar bibliotecas, fechar editoras e censurar escritores. É assim que se destrói um país, um povo, uma cultura. Muitos livros foram eliminados antes e depois de guerras, genocídios e perseguições políticas e religiosas.
No entanto, há formas menos evidentes de livrocídio. Tornar a leitura insuportável é também assassinar o livro, a longo prazo. Sufocando a leitura pouco a pouco, mata-se o livro... silenciosamente.
Podemos, numa sala de aula, matar a vontade de ler de nossos alunos? Podemos. Não é necessário, para isso, rasgar as páginas de um livro ou falar mal do autor! Basta fazer da leitura uma obrigação desagradável, improdutiva e estressante.
Nossas intenções são sempre as melhores. Ansiamos que nossos alunos sejam leitores plenos. Os métodos é que estão equivocados.
Um desses equívocos é nos preocuparmos mais com as provas e testes sobre a leitura e menos com o desenvolvimento dos próprios leitores. Se avisamos que a leitura obrigatória será objeto de perguntas (capciosas, difíceis) na primeira aula da próxima segunda-feira, que bela e entusiasmada leitura nosso aluno fará no final de semana!
As provas e testes produzem leitores padronizados. A leitura deixa de ser exercício intelectual, viagem imaginativa, ocasião de descobertas e autodescobertas, para se tornar manual de instruções. O leitor deverá dar a resposta certa. Ou será punido!
A principal consequência desse equívoco didático é aniquilar o interesse pela leitura, substituído agora pela necessidade de conseguir uma boa nota. Essa história já é tão conhecida... E o final jamais é feliz.
Outro equívoco: insistir na leitura de textos e obras que não dialogam com o universo dos alunos. É claro que José de Alencar, Machado de Assis, Clarice Lispector, José Lins do Rego, Manuel Bandeira, Cecília Meireles e Guimarães Rosa devem ser lidos. Na hora certa! E esta hora não é necessariamente a do ensino médio.
Outro equívoco que promove o livrocídio: fazer a desleitura dos livros. A desleitura solicita resumos (que se copiam de vários sites da web), prende-se em demasia à biografia do autor e ao contexto histórico, repete as interpretações já consagradas, transforma o livro em meio e não numa finalidade (prazerosa) em si. Tal desleitura afasta os leitores dos livros. E estes, abandonados, cometem livrocídio coletivo!
Existe algo mais desanimador para uma criança ou adolescente do que as eternas fichas de leitura, que querem fixar a leitura? Que ideia fixa é esta? Queremos fixar ou libertar? Parodiando Adélia Prado: “eu leio um livro para ver se me livro!”
Os livros podem ser uma bela paisagem para o aluno contemplar, visitar, explorar e recriar. Mas se apresentarmos essa paisagem por uma janela estreita, a visão se limita, a visita se impossibilita, não haverá exploração ou recriação alguma. Apresentar a literatura e outros textos pela janela deprimente de uma prisão faz da leitura tarefa sufocante. Os nossos alunos veem a leitura nascer quadrada. E sonham fugir para mundos melhores.
Para que serve a leitura, afinal? Como trazer os livros para a vida das crianças e dos jovens? Como tornar a escola um lugar onde os livros vivam e deem intensidade às nossas vidas?
A leitura nos ajuda a sermos intérpretes originais do nosso cotidiano, e deve se tornar tema de animadas discussões em sala de aula. Para isso, temos de sugerir livros e textos relacionados ao que está acontecendo ao nosso redor.
Obras e autores clássicos não estão excluídos. Contanto que saibamos atualizá-los, vinculando-os aos problemas que preocupam a todos, aqui e agora.
Texto publicado na edição de junho de 2012 da revista Profissão Mestre. Deixe seu comentário na seção Voz do Leitor.
Publicado originalmente em:
http://www.profissaomestre.com.br/view/action/visualizarArtigo.php?cod=430
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